Numb
Sempre achei que "não tenho tempo" era uma desculpa esfarrapada que as pessoas tinham. Sempre achei que todo o mundo tinha tempo para fazer o que quisesse e que não o fazia por falta de força de vontade e/ou capacidade de gestão/organização. Ao final de dois meses de trabalho, posso dizer que acabei por provar que eu sempre tinha razão.
Não tenho feito nada daquilo que queria fazer durante os meus tempos-livres. Coloquei o exercício físico de lado, apenas escrevo ao fim-de-semana e sobre nada em concreto e sem lógica, mal tenho pegado em livros e visto filmes/séries. Todos os dias enfio-me na cama a dizer que o dia seguinte será melhor, mas, mal acordo, sei que o dia não será muito diferente do anterior. Tenho-me tornado num zombie, que faz as coisas de forma rotineira e que perdeu o prazer de as fazer. Ao longo das 8 horas de trabalho, sinto-me minimamente viva, muito à custa da necessidade de fazer as coisas o melhor possível e com urgência. Mas, assim que coloco os pés dentro de casa, o piloto automático aparece e, quando dou por mim, estou enfiada na cama e passei o tempo todo desde que cheguei a casa perdida nas redes sociais. Tenho uma lista enorme de artigos que gostaria de ler, mas não consigo convencer-me a ler-los. E passo os fins-de-semana a dormir ou a desejar que estivesse a dormir.
Acabei por me tornar na pessoa que passei anos a dizer que jamais me tornaria.
I feel numb
Mas as coisas começaram a mudar esta semana. Fui ao Coliseu ver um espectáculo de ballet. Comecei a acender uma vela assim que chego a casa e a ser mais meticulosa enquanto faço a minha cama. Voltei a pegar num livro e a ler com prazer. Rearranjei a minha estante e comprei mais livros. Voltei a pintar as unhas e voltei a dançar como se ninguém estivesse a ver. Até já dei por mim a cantarolar.
É através de pequenos passos que uma pessoa consegue readquirir o controlo da sua vida. E eu, finalmente, comecei a dar esses pequenos passos.