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Tu tens a mania

Tu tens a mania

Um novo respirar

Sinto-me incrédula. Ainda não acredito que neste momento me encontro a escrever e não a preparar-me para sair e ir trabalhar. É um misto de sensações que não consigo explicar bem. Por um lado, um entusiasmo pelos dias que irei ter de descanso e de fuga à realidade. Por outro, uma ansiedade e receio que tudo não passe de uma miragem. Mas, na sua maioria, sinto uma esperança pelo descanso e claridade mental que irei adquirir nestes dias

Se há uns anos atrás me dissessem que eu iria passar por uma pandemia e por um burnout, eu diria que estavam a imaginar disparates. Porém, agora, percebo que, tendo em conta a pandemia, era inevitável sofrer de burnout. Durante este ano e tal, senti-me tão ou mais presa do que na relação tóxica que tive. Senti-me com medo, revoltada, frustrada, sem esperança. Senti que o mundo parou e, com ele, a minha vida. Via as pessoas a conseguirem criar novas rotinas e a desenvolverem novas aptidões. E eu sentia-me a cair num redemoinho de pensamentos negativos. O que nunca pensei, e só lá cheguei nestes últimos meses, é que entrei em modo sobrevivência. Literalmente, eu sobrevivi este ano pandémico. A grande maioria da população apenas sobreviveu. Acordávamos, íamos trabalhar e regressávamos a casa para realizarmos as tarefas básicas de sobrevivência. E acho que não temos dado valor suficiente a este facto. Nós não somos máquinas e não temos de ser produtivos as 24 horas que o dia nos oferece. E, quando temos a nossa segurança física a ser ameaçada, é normal entrarmos neste ciclo de "luta ou fuga". Se, pelo meio, conseguiste aprender uma língua nova ou se descobriste que tens jeito para a cozinha, bravo! Mas é preciso entender que nem todos o conseguiram e está tudo bem com isso. Cada um tem o seu ritmo e a sua capacidade de resiliência e adaptabilidade. Se calhar, se eu tivesse tido a oportunidade de trabalhar em casa, também teria conseguido aprender coisas novas, pois não me sentiria em perigo todos os dias

Eu acho que esta nossa sociedade está, infelizmente, demasiado virada para o trabalho e para esta noção palerma que temos de ser sempre produtivos. Mas não é possível ser-se assim tão produtivo sem consequências físicas e mentais. E é por isso que, durante estas férias, quero focar-me em não ser produtiva. Quero dedicar-me ao dolce far niente. E quero conseguir ter uma relação íntima com a arte de fazer nada ao ponto de a apreciar e aplicar quando regressar ao trabalho e tentarem exigir mil e uma coisas de mim

Mas, agora, estou de férias. E, por isso, toca a desligar o cérebro. É o momento de iniciar o reset

Countdown

Daqui a vinte e quatro horas estarei de férias. Daqui a vinte e quatro horas poderei desligar o despertador e acordar naturalmente, sem pensar que irei chegar atrasada ao trabalho. Daqui a vinte e quatro horas, deixarei de adormecer a pensar se me esqueci de fazer alguma coisa. Daqui a vinte e quatro horas, irei poder respirar fundo e focar só em mim e no que quero na minha vida

Desde que a pandemia, eu, tal como toda a gente, senti que a minha vida entrou em pausa. A vida passou a ser casa-trabalho-casa e mesmo com os desconfinamentos, o medo andava de mãos dadas comigo e pouco me atrevi a experimentar coisas novas ou a tentar readquirir os hábitos antigos em prol da sanidade mental. E creio que entrei em burnout exactamente por causa disso: o ritmo de trabalho aumentou, mas eu não tinha acesso àquilo que me permitia manter sã mentalmente

Fui me fechando dentro desta bolha de receios até chegar ao ponto de começar a rebentar. Felizmente, tenho estado a ser acompanhada por uma psicóloga que detectou esta bolha antes de ficar completamente cheia e temos focado as sessões destes últimos meses em mandar a exaustão dar uma volta sem que tenhamos de recorrer à baixa médica e a medicação. Não sei se é por estupidez ou alguma vontade de provar a mim mesma que consigo ser mais forte ou por achar mesmo que consigo superar esta situação, mas fui sempre recusando a medicação. Porém, não a poderei recusar para sempre e tenho a noção que se continuar no emprego que estou, no próximo ano terei de recorrer aos medicamentos. E isso acaba por me assustar. Porque, apesar de ter a noção que entrei nesta bola de neve por causa da pandemia, esta apenas foi o rastilho. Os explosivos já lá se encontravam prontos a explodir. E isto deve-se ao ambiente tóxico do meu local de trabalho

Acredito que existam locais piores. Mas não acredito que isso sirva para desculpar a empresa. Lá por os outros estarem piores, não quer dizer que tenhamos de nos sujeitar a pressões, faltas de respeito e manipulação. E é isto que sinto. Sinto que o meu trabalho é regularmente desrespeitado pela entidade patronal que decide tomar decisões sobre o meu sector e não se digna a consultar-me nem a informar-me (sei das coisas sempre por terceiros e é porque eles achavam que eu já sabia). Vêm falar comigo em tom de confidência e falam mal da minha equipa e esperam que eu tenha mão neles e, no entanto, não existe qualquer procedimento quando alguém decide recusar-se a fazer um trabalho só porque lhes apetece ou se passam o dia inteiro ao telemóvel. Fazem asneira, obrigam-te a remediar as coisas e depois eles é que são os maiores. E por aí fora. E depois ainda vêm com a lenga-lenga que nas outras fábricas também é assim. Mas como é que alguém pensa em melhorar a qualidade do trabalho e do produto oferecido se continuamos a pensar que se as outras empresas também trabalham assim, então não estamos num mau caminho? É uma empresa cheia de vícios que tenta destruir-te lentamente

E começo a sentir isso. Começo a sentir que estou a ser despedaçada aos poucos. O desgaste mental é tanto que quando chego a casa só me apetece ficar a olhar para a parede e/ou ouvir música. Felizmente, tenho um grupo de suporte extraordinário que tem feito questão de não me deixar atirar para o tapete e me tem incentivado a levantar todos os dias e enfrentar o circo de feras. Se não fossem elas, acredito piamente que estaria de baixa médica e medicada há vários meses. Os dias tornaram-se mais fáceis com as saídas repentinas para um carioca de limão ou as chamadas até a hora de jantar. E graças a elas, chego ao último dia antes de férias minimamente sã. Com um sorriso nos lábios e uma calma ansiedade. Só tenho que enfrentar mais oito horas de trabalho e depois serão umas semaninhas de descanso e reflexão. Preciso mesmo de desligar o cérebro do trabalho e focar no que sinto e no que quero. Há muito que não consigo fazer estas reflexões e sinto-me realmente entusiasmada por finalmente poder dedicar-me a isso sem que a minha cabeça comece a pensar em tudo o que ainda tenho que ir fazer antes de ir dormir

Só são mais oitos horas. Depois, irei fazer uma rave no meu quarto até o sono abater-se sobre mim, desligar o despertador e adormecer com um sorriso nos lábios

Countdown

Daqui a vinte e quatro horas estarei de férias. Daqui a vinte e quatro horas poderei desactivar o despertador e acordar naturalmente sem pensar que irei chegar atrasada ao trabalho. Daqui a vinte e quatro horas, deixarei de adormecer a pensar se me esqueci de fazer alguma coisa. Daqui a vinte e quatro horas, irei poder respirar fundo e focar só em mim e no que quero na minha vida
Desde que a pandemia, eu, tal como toda a gente, senti que a minha vida entrou em pausa. A vida passou a ser casa-trabalho-casa e mesmo com os desconfinamentos, o medo andava de mãos dadas comigo e pouco me atrevi a experimentar coisas novas ou a tentar readquirir os hábitos antigos em prol da sanidade mental. E eu creio que entrei em burnout exactamente por causa disso: o ritmo de trabalho aumentou, mas eu não tinha acesso àquilo que me permitia manter sã mentalmente. Fui me fechando dentro desta bolha de receios até chegar ao ponto de começar a rebentar. Felizmente, tenho estado a ser acompanhada por uma psicóloga que detectou esta bolha antes de ficar completamente cheia e temos focados as sessões destes últimos meses em mandar a exaustão dar uma volta sem que tenhamos de recorrer à baixa médica e a medicação. Não sei se é por estupidez ou alguma vontade de provar a mim mesma que consigo ser mais forte, mas fui sempre recusando a medicação. Porém, não a poderei recusar para sempre e tenho a noção que se continuar no emprego que estou, no próximo ano terei de recorrer aos medicamentos. E isso acaba por me assustar. Porque, apesar de ter a noção que entrei nesta bola de neve por causa da pandemia, esta apenas foi o rastilho. Os explosivos já lá se encontravam prontos a explodir. E isto deve-se ao ambiente tóxico do meu local de trabalho. Acredito que existam locais piores. Mas não acredito que isso sirva para desculpa a empresa. Lá por os outros estarem piores, não quer dizer que tenhamos de nos sujeitar a pressões, faltas de respeito e manipulação. E é isto que sinto. Sinto que o meu trabalho é regularmente desrespeitado pela entidade patronal que decide tomar decisões sobre o meu sector e não se digna a consultar-me nem a informar-me (sei das coisas sempre por terceiros e é porque eles achavam que eu já sabia). Vêm falar comigo em tom de confidência e falam mal da minha equipa e esperam que eu tenha mão neles e, no entanto, não existe qualquer procedimento quando alguém decide recusar-se a fazer um trabalho só porque lhes apetece ou se passam o dia inteiro ao telemóvel. Fazem merda, obrigam-te a remediar a coisa e depois nada se passa. E por aí fora. E depois ainda vêm com a lenga-lenga que nas outras fábricas também é assim. Mas como é que alguém pensa em melhorar a qualidade do trabalho e do produto oferecido se continuamos a pensar que se as outras empresas também trabalham assim, então não estamos num mau caminho? É uma empresa cheia de vícios que tenta destruir-te lentamente. E começo a sentir isso. Começo a sentir que estou a ser despedaçada aos poucos. O desgaste mental é tanto que quando chego a casa só me apetece ficar a olhar para a parede e ouvir música. Felizmente, tenho um grupo de suporte extraordinário que tem feito questão de não me deixar cair no tapete e me tem incentivado a levantar todos os dias e enfrentar o circo de feras. Se não fossem elas, acredito piamente que estaria de baixa médica e medicada. Os dias tornaram-se mais fáceis com as saídas repentinas para um passeio ou as chamadas até a hora de jantar. E graças a elas, chego ao último dia antes de férias minimamente sã. Com um sorriso nos lábios e uma calma ansiedade. Só tenho que enfrentar mais oito horas de trabalho e depois serão umas semaninhas de descanso e reflexão. Preciso de desligar o cérebro do trabalho e focar no que sinto e no que quero. Há muito que não consigo fazer estas reflexões e sinto-me realmente entusiasmada por finalmente poder dedicar-me a isso sem que a minha cabeça comece a pensar em tudo o que ainda tenho que ir fazer antes de ir dormir
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